Capítulo I - A morte
Sorria para a morte.
Era um conselho estranho, de fato, mas para ele tinha seu sentido.
Do que adianta temer o que era inevitável?
Ele nunca desejou viver mil anos, agradecia simplesmente estar feliz a cada dia...Até o momento que a morte apareceu na sua frente.
Ela estendia a mão com compreensão... E, de acordo com a educação que aprendeu (com custo), quando alguém é educado com você, o certo é retribuir.
Então ele sorriu.
E ela retribuiu.
Então, sorria para a morte, ela pode retribuir.
O recebeu como uma velha amiga, não soltou sua mão todo o caminho até o outro mundo, feliz que alguém a recebia com tanto apreso.
- Não são muitos - Ela dizia com sua voz distante - que sorriem ao me ver. Essas são as almas mais plenas, é sempre uma honra e um pesar levá-las.
Ele não respondeu, apenas se deixou levar. O outro mundo, para sua surpresa, não era muito diferente do seu...Apenas mais...Vazio? Pálido?
Não teve muito tempo para explorar, no entanto, quando um grande volume de cabelos ruivos se lançou em sua direção o abraçando com uma força esmagadora.
-...E-estou tão orgulhosa!! E-e tão triiiste!!
A morte, sorrindo, se afastou.
- Te deixo com tua mãe Portgas, e com todos do outro mundo que por você tem apreço. E desapareceu.
Ele envolveu a mulher, sem acreditar nas últimas palavras que escutou.
- M-mãe...?
Alguém, em algum lugar, alguma vez disse..."Não tenha pena dos mortos, tenha pena dos vivos".
E nesse dia, enquanto suas pernas perdiam as forças e seu lamento ecoava pelo vazio nos braços da mulher que apenas imaginou como seria... Portgas D. Ace entendeu plenamente o que essas palavras queriam dizer...
Ele nunca chorou tanto em vida, como na morte.
Ele jamais pensou que riria tanto também.
O calor de uma mãe, suas palavras doces, suas sardas contra as delas quando distribuía beijos em seu rosto.
Para sua tristeza e felicidade Barba Branca logo apareceu naquele lugar também. Ace pensou que seu corpo não resistiria a tantas lágrimas, mas ele já estava morto de qualquer forma.
De pesar, de preocupação, de medo... Esperou com uma aflição mil vezes pior do que tudo que enfrentou em Impel Down se a alma de seu irmão chegaria aquele lugar também.
E num alívio maior do que lembrava alguma vez ter sentido em vida, ela nunca chegou. Ele estava vivo...! Havia sobrevivido, para se tornar o rei que sabia que ele se tornaria.
Afinal, era seu irmãozinho.
Com essa realização em mente, ele tentou procurar seu outro irmão mais novo... No entanto, por mais que percorresse todos os rincões do além não conseguia encontrá-lo.
Surpreso foi quando conheceu alguns de seus ancestrais, alguns de Luffy, pessoas que vieram lhe agradecer por coisas que não entendia...
Irritado foi quando conheceu Roger, que o seguiu por muito tempo em sua busca fraternal tentando conquistar algum afeto de seu filho, desnecessário será dizer que falhou miseravelmente.
O Rei dos piratas, no final das contas, não foi o homem que conseguiu tudo no mundo, pois mesmo em morte não obteve o amor de seu único filho.
Ace não deixava de ser menos teimoso como morto, mesmo sua mãe suspirou vencida observando com pesar que ele aceitar seu pai não parecia ser uma tarefa possível.
E assim o tempo passou...E os anos...Não que os mortos tivessem muita noção de tempo de qualquer forma.
Até que um dia...
- Você deve ser Portgas D. Ace?
Ace virou para o homem que caminhava em sua direção, num penhasco com vista para um mar infinito e branco. Era moreno, cabelos longos e com tatuagens pelos braços.Tinha um ar familiar e ao mesmo tempo um ar sábio.
-...Quem quer saber?
- Eu ouvi falar de você... O que você fez... Você é muito famoso entre os fantasmas no mundo dos vivos, ouço dizer que quase tão famoso quanto é com os vivos...
-...Fantasmas no mundo dos vivos? - Nesse momento o homem misterioso sentou ao seu lado vendo o horizonte sem fim com uma expressão indecifrável. - O que quer dizer com isso?! E quem é você?
- Sim, os espíritos que abandonaram o outro mundo para acompanharem de perto suas pessoas especiais. Os humanos chamam isso de fantasmas creio. Embora, quando são espíritos ruins eles também levam esse nome.
-... Está me dizendo que podemos sair desse lugar e voltar?! Quem diabos é você! E como sabe disso?! - Simplesmente não era o momento para ser educado.
- Eu? Apenas um nome numa pedra eu diria. E como sei disso? Digamos que eu sou muito velho... Realmente não me impressiona muito que ninguém tenha te dito que é possível sair daqui, é uma decisão dolorosa e poucos conseguem voltar... Ou talvez eles apenas não queiram.
-...Então .. É mesmo possível...? Por que eu deveria acreditar em você?!
E para isso o sujeito começou a ir abertamente.
- Tudo é possível enquanto alguém acreditar! E por que você desconfiaria de mim? Já estás mortos, o que mais tem a perder?
Ele tinha um ponto.
- A morte é minha amiga e ela é gentil com quem lhe sorri - Ele levantou-se - Eu pedi um barco a ela imaginando que você estaria interessado em sair, ele está abaixo desse penhasco. Reme até o infinito, na direção do nada, o princípio será a porta, o sofrimentos serão as paredes da saída, a solidão sua guia. Quando for o dia de seu nascimento o caminho se abrirá e antes que esse dia volte você deve regressar para cá, isso ou ficará preso no mundo dos vivos até todos os nós de sua alma se desatarem.
Ace o observou por alguns segundos antes de virar a cabeça num total sinal de incompreensão, o que para a sua irritação apenas fez o outro homem gargalhar.
- Oh bem, inteligencia nunca foi um forte meu também! Meus velhos amigos sempre me diziam isso!! - E seguiu gargalhando até receber um olhar irritado do mais novo - Ah, certo, certo... Apenas se despeça dos que tem aqui, pegue o barco e reme em linha reta, uma hora você chega. Volte antes de um ano, caso contrário...
- Caso contrário...?
- Como eu vou saber?! Eu sempre voltei antes - E voltou a gargalhar.
Se esse maldito velho já não estivesse morto, ele definitivamente o mataria.
- Ah! Só mais uma coisa, evite uma mulher chamada Charlotte Linlin, a habilidade pode ser um problema para nós. Aliás, alguns usuários devem ser capaz de te ver, dependendo de sua habilidade. O novo usuário de sua fruta talvez também consiga te ouvir, no entanto, eu não estaria muito esperançoso disso, qualquer um pode obtê-la afinal - Sorriu misteriosamente - Mas um nunca sabe o que pode acontecer.
- ... Isso é bem mais do que uma coisa - Resmungou Portgas enquanto tentava lembrar onde já ouvira o nome "Charlotte Linlin".
- Você se preocupa demais para um morto! - Tornou a rir se afastando - Foi um prazer te conhecer irmão do futuro rei!
- Ei!! - Ace deu alguns passos na direção do desconhecido que parou, mas não virou para trás. - Me diga pelo menos o seu nome!
Não era preciso ver seu rosto para saber que sorria.
- Pode me chamar apenas de Boyo meu caro amigo, logo voltaremos a nos ver, no mundo dos vivos!
Portgas D. Ace ficou ali, de pé, repassando esse momento em sua cabeça alguns instantes antes de se adiantar até o fim do precipício e certificar-se que o barco de fato estava ali.
...Seria difícil se despedir de sua mãe, de Oyaji... Mas seria um alívio se livrar de Roger!
O mundo dos vivos... Poderia ver Luffy! Marco, Haruta, Izou! Todos seus irmãos que ainda estavam vivos... E talvez... Um desses fantasmas fosse Sabo?
Ele não sabia, mas estava prestes a descobrir.
Por isso sorria para a morte, ela é apenas a aventura seguinte.